sábado, 5 de julho de 2008

A Porta para o Nada - Parte Final


Autor: Thiago Araujo

"Parte Final do conto até o proximo sabado, talvez pq ta dificil de arrumar uma net..."


Entramos e ele insistiu para fazer o um chá, de acordo com ele sempre foi assim com meu avô, e não duvidei pois sabia onde encontrar tudo, acabei acatando seu pedido. Sentamo-nos na sala de estar de frente para a lareira, que estava apagada claro, afinal ainda era manhã. Comecei minhas interrogações.

- meu avô era bem diferente, você por acaso sabe o que ele fazia aqui?
- ah seu avô era uma pessoa muito curiosa, para tentar explicar tenho que contar tudo que sei sobre seu avô. – é como toda pessoa de idade Jamal também gostava de se alongar em suas histórias.

- conheci Armand a cerca de vinte anos atrás. Sabe este é um lugar místico sagrado, onde o povo da minha tribo agradecia aos espíritos do céu, terra, aguá, fogo e da floresta. Antigamente esse ritual acontecia a cada sete dias, mas com o progresso do homem a dissolução da tribo o costume foi se perdendo, passou a ser uma vez por mês, e logo uma vez por ano e foi numa desses rituais anuais que conheci Armand, ele era um explorador e veio conhecer a tribo, ficou espantado com tudo que acontecia durante a ritual, acho que, naquele dia ele pode ver mais do que todos na tribo o significado daquilo.

- quando a tribo se desfez seu avô comprou o lugar e construiu essa casa. eu sou o único da minha tribo que ainda vem aqui uma vez por semana para que o costume não se perca, seu avô sempre deixou que eu fizesse meu ritual. Ele dizia que podia ver os espíritos e que planejava fazer contato com eles.

- então meu avô achava que podia falar com espíritos?
- Armand era uma pessoa muito espiritualizada, quem poderia dizer se era verdade ou não? Você esta aqui a quanto tempo? Também não viu algum espírito?

Não quis responder a essa pergunta, na verdade não sabia como responde-la, e ele pareceu satisfeito com meu silencio, demonstrando um sorriso fino e furtivo.

- se me permite eu gostaria de fazer minhas preces.
- Claro fique a vontade, não perca sua viagem.

Passei o resto do dia vendo-o preparar uma fogueira para o ritual enquanto me contava historias de sua tribo. Era uma tribo muito antiga mesmo, dizia ele que eles eram o que sobrou do povo de machu pitchu antes de desaparecer sem explicação, dizia que seus guerreiros eram capazes de incorporar espíritos guerreiros que chamavam de totens, e que coagiam e trocavam favores e oferendas para obter ajuda de outros espíritos não guerreiros, para colheitas, chuvas e fertilidade de suas mulheres. Eu era um ótimo ouvinte e ele gostava de falar.

Quando terminou a fogueira ele começou o ritual, eu fique da varanda dos fundos apenas observando, enquanto tomava um café. Ele fazia uma dança rodeando a fogueira, isso já era um pouco tarde, ele não se apressou nem um pouco para a preparação e ainda parou para almoçar, por isso já estava anoitecendo.

Seus passos era hipnotizantes e enquanto o fazia, parecia se formar uma leve neblina em volta e acima da fogueira, quando eu prendia meu olhar nessa névoa era como se visse imagens, rostos se formavam, rostos de sofrimento e um rosto me pareceu familiar dentre essas formas, paisagens desérticas e sombrias, e outras formas inconcebíveis ou que eu não conseguia interpretar. É claro que se fosse em outro lugar em outra circunstancia isso não me surpreenderia nem um pouco, seria como olhar aquelas manchas que os psicólogos tem, cada um vê o que quer, mas este lugar me causava arrepios e esse dia com Jamal e suas histórias não contribui muito para me acalmar.

Depois que acabou perguntei a Jamal se ele gostaria de passar a noite aqui. Sua reação me impressionou, por ser uma pergunta simples. Vi em seu rosto um espanto e medo mudo, mas não em relação a minhas palavras, era mais como se o que eu disse o tivesse remetido a uma lembrança ruim, adormecida em algum canto de sua mente onde ele não queria mais chegar perto. Ele respirou fundo antes de responder.

- não jovem, essa terra não me pertence mais...
- tem certeza? A noite eu escuto animais selvagens pela redondeza.
- não se preocupe, eu estou de moto, e além disso eu sou um velho nativo, eu sei como me cuidar.
Com isso dito subia a moto e o ronco do motor afirmava sua ida.

Fiquei ali na varanda por um tempo meditando, o que será que ele lembrou para ter aquela reação, e também tentava me lembrar o que fazia pela manha antes da chegada de Jamal. Mas um par de olhos brilhantes no mato adiante fez-me perer qualquer raciocínio, entrei rápido, tranquei a porta e fiquei observado pela janela, pela forma, pequena e pouco furtiva parecia mesmo um lobo, mas nessa escuridão a certeza era impossível.

Peguei a arma sobre a lareira, uma calibre 12, e olhei todos os cômodos para certificar-me de estar tudo trancado, pior do que acordar com aquele barulho infernal, seria acordar com um par de presas me rasgando a pele. Com tudo seguro, podia relaxar, mesmo ouvindo os uivos lá fora, fui preparar algo para comer e ir logo dormir.

E ora, para minha surpresa acordei apenas na manhã seguinte, tive um sono tranqüilo e sem sonhos. Por mais uma noite pude relaxar por completo nessa calmaria e paz. A única diferença foi que essas noites os animais pareciam estar mais próximos. Jasper também me ligou para saber como estava e se precisava de algo, e de imediato disse que tudo estava bem, para que não se preocupasse, que estava tendo dias tranqüilos, pescando, lendo e relaxando, ele pareceu satisfeito e disse que se precisasse de algo bastaria ligar.

Já estava ficando convencido que o barulho que ouvia era paranóia de minha parte, por ser a primeira vez a estar em um lugar sem nenhuma poluição sonora e sem nenhum ser humano por perto também.
Mas nessa terceira noite acordei novamente com a batida na porta, um pouco mais fraca desta vez. Passei pelo corredor sombrio, e assim que me aproximei não havia mais barulho. Voltei para a cama e dormi. Passei o dia seguinte ocupado consertando um painel do gerador solar que havia se soltado e praticamente não pensei no barulho até a noite.

As 03:00 da madrugada ouvi um estrondo imenso, fui de imediato ao corredor, apenas para ficar ainda mais apavorado, algo batia uma violência sobrenatural naquela porta, podia vê-la tremer a cada investida do que quer que fosse que lá estivesse, desci correndo, peguei a arma e subi, me aproximando da porta podia ouvir uma voz, não uma voz, um som gutural, parecido vir do fundo de uma caverna, pouco podia distinguir o que aquele som intimidador queria dizer, mas podia entender a ordem de “abra” no meio daquela balburdia, as batidas já estavam mais fracas, ao menos isso não era incansável, quando estava a cerca de meio metro da porta gritei “o que é que esta aí”, e imediatamente o barulho cessou, seguido por aquele silencio medonho.

Desci como uma bala e com o abajur que estava sobre a escrivaninha arrombei aquela gaveta trancada, procurando qualquer coisa que pelo menos me aliviasse da tensão que havia passado.. encontrei lá dentro um diário, que folheei rapidamente, pois estava escrito naquele mesmo idioma da porta, e uma caixinha, finamente trabalhada com entalhes também naquele idioma, onde encontrei uma chave dourada.

Peguei-a e subi até a porta. Eu devia estar louco nesse momento, mas com a arma em punho e mais do que preparado, enfiei a chave no buraco da fechadura, girei-a e pude ouvir o clique da tranca que há muito não se abria, chutei-a e empunhei a arma.
Não vi nada, apenas a noite, um céu sem nuvens, podia enxergar qualquer constelação de onde estava se as conhecesse. Ainda estava tenso, mais abaixei a arma e examinei tudo com mais calma e atenção, e percebi lá embaixo, devia haver uns dez lobos, talvez a alcatéia inteira estivesse ali, sentados e me encarando.

- animais desgraçados! – gritei e atirei na direção deles, tudo por conta do ódio que sentia no momento. Todos dispersaram rapidamente, mas pude ver que atingi um, havia um corpo ali que não se mexeu.
Preparei um chá antes de voltar para o quarto, já estava menos tenso e consegui cair no sono rápido.

Acordei na manha seguinte com o sol já bem alto. Sai até o local onde matara o lobo e constatei com muita estranheza que não havia corpo ali, mas havia muito sangue, com certeza o animal deveria estar morto, não sou zoólogo e não me importava o que havia acontecido, a menor de minhas preocupações agora era um lobo morto, pois agora notara, eu havia deixado aquela porta aberta, não sei em que esse ato poderia resultar, mas agora sentia um medo apenas de entrar na casa, mesmo de dia.

Dei umas duas voltas na casa antes de reunir coragem suficiente para adentrar. Assim que o fiz corri ao quarto e peguei a arma, não iria mais me separar dela.
Fui para o escritório, grato pela tecnologia que hoje temos, peguei aquele diário e comecei a pesquisar sobre aquele diário na internet. Perdi umas três horas até encontrar algo de relativa confiança, um tradutor, comecei a copiar a primeira pagina.

Dizia algo sobre o inicio de uma pesquisa que Armand iniciara a muitos anos. Somente este parágrafo que ficou muito traduzido me chamou a atenção.

“aprender xiak espíritos com ypalinay neo gamani espíritos dalak sunnin plano superior significa que eles malak akidar no alto astolton rarkaniome ali rui rugark portal dos mortos”

Apenas essas palavras que me chamaram atenção “portal dos mortos”. Digitei mais alguns textos e tentei novamente, mas já não conseguia nada, estava sem o sinal de radio, meu celular também não funcionava mais. Um estresse começava a me assolar, já me sentia totalmente perdido, e para piorar já estava anoitecendo.

Consegui controlar-me um pouco tomando um calmante, mas mantive-me acordado até as 03:00 da madrugada, quando ouvi a batida.
Dessa vez uma batida suave, nada daquela violência anterior.

- Doug? Você esta ai?
Paralisei, aquela era com certeza a voz do meu avo, levantei a arma.
- É mentira! Não pode ser você!
- Não temos tempo, me deixe entrar logo.
Eu já havia decidido dar pelo menos um tiro nesta coisa que me enlouquecia, mas diante desta nova perspectiva fiquei sem ação. Por fim virei a chave na fechadura dei dois passos atrás e preparei-me para atirar.
- esta aberta

A porta rangeu ao abrir-se, e o que eu vi ali era a figura calva e baixa de cabelos grisalhos de que me recordava, talvez um pouco mais velho, pois fazia alguns anos que não o via, ele ainda esperou alguns segundos, para confirmar que eu não ia disparar, depois entrou e fechou rapidamente a porta.

- há muitas coisas ruins daquele lado.
- meu deus Armand! O que significa isso? Você ressuscitou? – finalmente explodi depois de tanta anormalidade.
- não Doug, isso é temporário. Mas venha, vamos descer vou lhe preparar um chá, tenho cerca de meia hora para lhe explicar alguma coisa. - Ele se adiantou para a cozinha eu ainda custei para fazer as pernas me obedecerem

Ao chegar a cozinha a chaleira já estava no fogo e as xícaras separadas. Sentei-me, agora um pouco mais relaxado.
- bom então me explique o que acontece aqui.
- algo complicado de explicar em tão pouco tempo...
- simplifique! – cortei-o.
- veja bem Doug, eu sou um homem viajado e rico, pude presenciar praticamente tudo pelos quatro cantos do mundo – ele sentou-se de frente para mim – nos últimos anos presenciei uma tribo que conseguia realmente falar e abter ajuda de espíritos...

- a tribo de Jamal!
- vejo que o conheceu, esta certo a tribo de dele, os Inkatrat, descendentes das tribos maias. – apenas assenti com os olhos.
- bom assim comecei minha pesquisa neste lado espiritual e desconhecido, estudei sobre egípcios, celtas, voodo, tudo que possa imaginar, mas no fim acabei voltando para este lugar que foi o inicio de tudo, e descobri aqui que tudo, espíritos, demônios, tudo vem daquele lugar. - ele apontou para cima, obviamente queria dizer o outro lado da porta.

- e que lugar é este?
- é como se fosse uma via, um lugar onde todos os mundos e tempos coincidem, eu o denomino “o encontro”.

A chaleira apitou nesse momento, ele pausou sua narrativa para servir o chá. Eu não me importei com a pausa, aproveitei para meditar sobre essa idéia por um instante, com que tipo de coisa Armand havia se metido?

Ele serviu o chá e sentou-se novamente, tomou um gole da xícara, também bebi, e a quentura me reanimou um pouco para continuar a escutá-lo.

- e por lá também é possível alcançar o mundo subseqüente a este, do qual eu vim. – continuou ele.
- então existe um céu e inferno?
- não saberia defini-los, provavelmente haja um caminho até esses lugares, mas o importante é que eu tenho estudado esse lugar, ainda não sei por que ou como isso vai ajudar a mim ou a outros, mas sei que minha pesquisa precisa ser continuada.
- e o que eu... – comecei a sentir-me tonto, meus músculos, relaxaram perdendo as forças, as pálpebras fecharam-se e tudo ficou escuro.
-doug?... – ainda pude ouvi-lo chamar.

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Recobrei a consciência em um lugar estranho, um deserto cinza, com um céu preto, sem nenhum ponto que pudesse chamar de estrela.

Levantei a cabeça e sentei-me com dificuldade, quando olhei para frente minha mente desanuviou-se, lá estava, no outro lado da porta no corredor, uma pessoa, mas não uma pessoa qualquer, era eu que estava ali, minha imagem, a uns dez metros de mim, na verdade ele estava dentro da casa e eu do outro lado do que pude supor ser a maldita porta, tentei levantar-me mas não consegui, segui então do jeito que pude, arrastando-me.

- sabe Doug! – a voz que escutava era a minha, mas o jeito de falar, com certeza era Aramnd – Quando eu disse que minha pesquisa precisava ser continuada, quis dizer que “eu” preciso continuá-la – já havia me arrastado uns cinco metros, mas ainda não conseguia emitir som algum – Claro q sem sua contribuição isso seria impossível, eu precisava de um veiculo para este mundo, e, principalmente alguém para me substituir aí, ou ele viriam atrás de mim. – estava a um metro da porta, quando ele ele aproximo-se.

- Adeus Doug, não o esquecerei farei o que puder a você.
A porta rangeu fechando, ainda observei o batente em forma de gárgula uns segundos antes da porta desaparecer em pleno ar, sem deixar vestígio algum, deixando apenas a visão do deserto cinza. Tentei gritar, mas somente um grunhido saiu de mim, e este ainda foi suprimido por um som gutural, que eu so podia pensar ser “eles”.

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Um grande Sol laranja despontava no horizonte, e a despeito do hábito da natureza, uma grande quantidade de lobos enfileirava-se em frente a casa. O homem saiu e a cada passo se, como se para um rei, os lobos abaixavam a cabeça em reverencia. O homem levou o celular ao ouvido.

- Jasper, dez dias se passaram. Haja com a papelada, mas não venda esta propriedade, e traga-me mais suprimento, irei morar aqui por uns tempos...

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